terça-feira, 6 de outubro de 2009

O Agrônico

O agrônico chegou às 15 para 5. Meu expediente (é chique falar assim, né?) termina às cinco e não vou ficar além de meu horário, não. Não ganho horas extras, pensei. Desta vez trouxe um rapaz com ele. Deve ser um desses universitários estagiários. Conheço esse tipo; não sabe nada, vive dentro da universidade com seus livros, roupinha limpa, perfumado e uma vez ou duas por mês vem aqui me ensinar como aplicar o adubo, o fertilizante, os venenos e até como lidar com animais, interferindo na função do estagiário de veterinária; deve ser de vingança, pois o outro também faz o mesmo. Esses universitários filhinhos de papai! Outro dia ainda quis me dar aula de psicologia ou psiquiatria ou sei lá o quê, dá no mesmo! Falou de um tal de Fróide, de umas teorias... Mas cortei logo suas asinhas: escuta aqui moço inteligente, eu também tenho uma teoria (aprendi isso com meu irmão; ele sempre fala que toda vez que a gente for iniciar um assunto deve-se iniciar dizendo que tem uma teoria. É bonito, dá respeito, as pessoas, principalmente esses intelectualóides, gostam de teorias e as respeitam, mesmo que elas não sirvam para nada.), pobre não tem essa coisa de psicologia ou sei lá o quê, não. Pobre tem fome, dor de barriga e bicho de pé (um vizinho meu tinha bicho de pé até na mão, na direita entre os dedos polegar e indicador, bem ali no colinho, na carne macia). Ele parece que não gostou muito! Nem liguei para sua reação; burguesinho metido à besta. Passou toda a vida dentro da sala de aula e vem querer me ensinar como moer cana, podar laranja, café; erguer curva de nível. Suas pranchetinhas nunca servem pra nada. Fazem um monte de cálculo e no final a curva sai reta; na primeira chuva estoura. Imbecis!
Mas nesse dia fui curto e grosso: não vou ficar depois das cinco hoje, não, moço. “É que o carro furou o pneu no caminho”, justificaram-se eles. O pneu deve furar todos os dias, pensei comigo. Tinha dado uma chuva e o estagiário não queria descer para não sujar os pés. Bibelô! Então, voltem amanhã, que hoje não vai dar tempo de regular a bomba; o senhor sabe que não adianta começar esse tipo de serviço e deixar no meio – isso era verdade. Era dez pras cinco, olhei no relógio e comecei a limpar a enxada. O agrônico entrou (dentro do) carro e ficou conversando com seu pupilo. Saiu e disse pra mim: “Deixe a chave do trator e as ferramentas que nós mesmos vamos fazer sem você”. Tudo bem, respondi-lhes, já com um risinho. Eu sabia que eles não iam regular sozinhos aquela bomba, com todos aqueles bicos encravados. A maioria tem de ser solta com alicate e eles nem sabem segurar um alicate. Imbecis, pensei; vão quebrar a cara. Arrumei tudo pra eles, tudo que precisavam e deixei disponível. E fui embora. Desci pra casa pensando: não dou 20 minutos e eles estão batendo na porta pedindo ajuda ou abandonam a empreitada; até porque logo escurece nessa época e os pernilongos atacam, pelo menos se fosse horário de verão!
Errei!
Passou-se meia hora! Antes de tomar banho fui tratar das galinhas e juntar os ovos do dia; estava entrando em casa quando escutei um barulho de carro encostando...

Nenhum comentário:

Postar um comentário